Mudanças no mercado da construção e novos materiais acústicos tornam mais viável (re)conquistar o que um dia já foi tão simples
Depois de um dia de trabalho, tudo o que se deseja em casa é paz e tranquilidade. Mas você ouve o vizinho assistindo à final do campeonato, as crianças do andar de cima brincando de pega-pega na sala e o caminhão da coleta de lixo parece invadir a mesa do jantar.
A poluição sonora, identificada como um dos principais problemas dos moradores de condomínios, tem basicamente duas fontes: ruídos externos que penetram as fachadas dos prédios (trânsito, aviões, casas noturnas, estádios de futebol, obras) e aqueles gerados em apartamentos vizinhos, separados apenas por lajes e paredes internas.
O arquiteto Davi Akkerman, do escritório Harmonia Acústica, em São Paulo, explica que quando a fonte e o receptor estão no mesmo ambiente (como em um home theater, por exemplo), o conforto acústico é obtido por meio de elementos que promovam a absorção sonora, a exemplo de feltros, mantas e painéis.
“Já nos casos em que a fonte e o receptor ficam em ambientes distintos é necessário bloquear o som adotando-se elementos de isolamento específicos”, completa.
Em edifícios, os pontos mais vulneráveis aos barulhos externos são as portas e janelas situadas nas fachadas, que nem sempre oferecem qualidade e boa vedação.
Precisamente o ponto crítico de um apartamento com duas suítes voltadas para a rua onde ocorre uma feira livre, na capital paulista. “Resolvemos o problema substituindo as janelas e a porta-balcão originais do prédio de 30 anos por outras, no mesmo padrão, feitas por um fornecedor especializado em acústica”, diz a arquiteta Ieda Korman, autora da reforma no imóvel.
Vale saber: na impossibilidade de trocar a esquadria existente, uma alternativa é instalar uma segunda janela por dentro. Demais intervenções pedem a orientação de um profissional especializado em acústica, um arquiteto ou engenheiro.
RANKING DO BARULHO
A poluição sonora é o segundo problema ambiental que mais impacta a saúde da população
Silêncio, por favor!
Atrás apenas da sujeira que paira no ar das cidades, a poluição sonora é a maior causa de males como dores de cabeça, insônia e estresse. A partir de 75 decibéis (o equivalente ao barulho de uma rua com tráfego intenso), há riscos de perda auditiva, que se agravam quando a exposição ao ruído é prolongada.
45 decibéis é menos do que uma conversação o tranquila . esse é o limite estabelecido pela ABNT* para o período noturno em áreas residenciais
*Associação Brasileira de Normas Técnicas
Drama histórico
São Paulo está entre as cidades mais barulhentas do mundo. E o problema vem de longe. Em 1867, já havia multa para carros de bois com eixos que rangessem por falta de graxa. Em 1912, um ato municipal proibiu o estalo de chicotes em cavalos que conduziam carruagens, para evitar o barulho.
250 mil habitantes. Toda cidade na União Europeia com essa população (ou maior) deve ter um mapeamento acústico para identificar as áreas ruidosas. No Brasil, Fortaleza já possui o seu, São Paulo ganhou um projeto piloto (www.mapaderuidosp.org.br) e Natal, Brasília, Maceió, João Pessoa, Santa Maria (RS) e São Luís começaram iniciativas nesse sentido.
CONSTRUTORAS MAIS ATENTAS
A NBR 15.575, da ABNT*, que completa cinco anos este mês, obriga as empresas a oferecer um nível mínimo de desempenho acústico nas habitações que erguem – isso afetou toda a cadeia de materiais relacionados
Até junho de 2013, quando entrou em vigor a Norma de Desempenho (como é mais conhecida), a performance acústica era assunto negligenciado pelas construtoras por falta de regras e legislações.
O que se via até então eram prédios novos subirem dotados de paredes internas cada vez mais finas e lajes entre pavimentos com apenas 7 cm de espessura, em detrimento do conforto dos moradores. Com o advento da NBR 15.575, isso mudou.
Ela estabeleceu três níveis de desempenho acústico (mínimo, intermediário e superior) e definiu como obrigatório o atendimento ao menor deles, considerando-se o barulho percebido em lajes, paredes internas, fachadas, coberturas de uso coletivo, sistemas de elevadores e até descargas e tubulações hidráulicas.
“Foi um marco histórico, que obrigou as construtoras a olharem para o tema”, afirma Davi Akkerman, também conselheiro da Associação Brasileira para a Qualidade Acústica (ProAcústica).
Segundo Fábio Villas Bôas, diretor do Sinduscon-SP e um dos responsáveis pelo desenvolvimento da norma, ainda estamos numa fase de transição, com a entrega dos primeiros empreendimentos baseados nas novas regras, mas já é possível sentir as mudanças.
“Os fabricantes de materiais de construção, por exemplo, agora investem em programas setoriais de qualidade para comprovar o bom desempenho de seus produtos”, conta.
Tamanha movimentação se justifica. Afinal, tratar acusticamente um apartamento pronto pode custar muito caro e nem sempre é viável, avalia o engenheiro Zew Tabacnik, da ZW Engenharia.
“O ideal é as construtoras entregarem unidades com mais qualidade – e a tendência é o consumidor se tornar cada vez mais exigente em relação a isso”, diz ele.
via: https://arquiteturaeconstrucao.abril.com.br/novidades/novas-regras-ajudam-a-amenizar-ruidos-externos-e-causados-por-vizinhos/